Confira a entrevista concedida pelo senador Otto Alencar ao jornal Tribuna da Bahia, publicada em 3 de dezembro de 2018.
“Bolsonaro tem adotado medidas compatíveis com o discurso de campanha”
OSVALDO LYRA EDITOR DE POLÍTICA
Tribuna – Como o senhor viu o resultado das urnas? E a vitória de Bolsonaro?
Otto Alencar – Foi uma eleição em que, no segundo turno, concorreram dois projetos. Um projeto que já vinha há algum tempo, que é herdado pelos ex-presidentes Lula e Dilma. E o projeto de direita, liberal, e venceu. Até porque já foram quase que 14 anos de um projeto do ex-presidente. Portanto, pode ter havido algum desgaste pelo tempo e pelos problemas que aconteceram de denúncias da mídia. Venceu Jair Bolsonaro com uma nova proposta de governo, que começa a partir de janeiro. Vamos aguardar o desenrolar dos fatos.
Tribuna – Como o senhor vê a postura de Bolsonaro? O que pensa sobre a equipe que está formando?
Otto Alencar – Está formando [uma equipe] que é compatível com o discurso dele, colocando um ministro da Economia que defende uma posição liberal radical. Tem propostas de privatizar algumas empresas estatais. Espero que não seja a de energia e a Petrobras. Vamos trabalhar para que isso não venha acontecer. Os outros componentes, alguns são oriundos da farda, do Exército, Marinha e até da Aeronáutica. Portanto, não enganou absolutamente ninguém. Está fazendo uma equipe compatível com o discurso dele e com o que defendeu durante a campanha eleitoral. Uma coisa que já era esperada. Vamos aguardar para ver se os resultados são favoráveis. Uma coisa eu tenho absolutamente certeza. Ele vai encontrar o país com os indicadores econômicos mais favoráveis. A inflação controlada, com reservas cambiais de US$ 380 bilhões, com a taxa Selic em torno de 6%, 7%, e o dólar parou de subir. E há um crescimento econômico pequeno de 1,5%, mas já mais favorável. Portanto, espero que ele, encontrando esse ambiente mais favorável, possa dar solução aos problemas que o Brasil ainda enfrenta. Uma coisa que teimo que possa acontecer é que ele venha diminuir os investimentos nos programas sociais, que reduzem a pobreza.
Tribuna – O que senhor achou da decisão de Sérgio Moro de deixar a magistratura para integrar o governo de Bolsonaro?
Otto Alencar – Eu acho que é uma decisão pessoal e sendo pessoal, tem que ser respeitada. Ele é da área técnica. Vai ocupar um cargo importante. Um ministério que está reforçado. Não esperava que ele aceitasse o convite. Até porque ele, no Senado Federal, quando esteve lá debatendo o projeto de abuso de autoridade, disse que não aceitaria um cargo político. Mas, do ponto de vista pessoal, não posso fazer outra coisa além de respeitar a decisão dele. De alguma forma, para quem condenou tantas pessoas e mandou para prisão tantas pessoas, na minha avaliação, é uma quebra de palavra. Ele disse que não e acabou sendo. É um cargo político e com forte presença dos órgãos de controle. Espero que possa fazer um bom trabalho e que possa abranger. Que os governistas possam ser tratados da mesma forma que os opositores. Ou seja, justiça para todos. A lei ser distribuída de alguma forma para todos.
Tribuna – Que rumo o senhor acha que a Operação Lava Jato terá após a saída de Sérgio Moro?
Otto Alencar – Acho que vai continuar no mesmo caminho. A Operação Lava Jato tem pontos altamente positivos. Pode ter tido aqui ou ali excessos, mas, de alguma forma, foi positiva para o país. A substituta, que foi indicada por Moro, deverá continuar. Não vejo que vá acontecer alguma alteração não. Até porque, nós temos uma legislação, um Código Penal, que tem que ser cumprido. Na minha visão, as ações da Lava Jato devem continuar.
Tribuna – O ministério de Moro vai conseguir enfrentar a criminalidade no país?
Otto Alencar – Só se houver uma modificação de alguns artigos do Código de Processo Penal. Tem alguns artigos do Código de Processo Penal que precisam ser modificados. Isso já está inclusive em tramitação no Congresso Nacional há algum tempo. Não foi ainda modificado e tem que ser modificada essa legislação. Não se pode hoje se prender um assaltante, um bandido de alta periculosidade, e ele sair com 10 dias com habeas corpus. Agora, o presidente atual quer fazer um indulto amplo e irrestrito para réus e condenados perigosos. Assisti agora, pela televisão, à avaliação dos ministros [do Supremo Tribunal Federal] e queria louvar a iniciativa do ministro Luís Roberto Barroso, [Luiz] Fux para que não chegue ao Natal e se faça um indulto de pessoas que já estão condenadas. Algumas de alta periculosidade que podem voltar ao convívio com a sociedade. O Ministério da Segurança estará fragilizado se mandar prender e a Justiça mandar soltar, como está acontecendo até agora. Esse é o maior questionamento da Polícia Federal, da Polícia Civil e Militares. A polícia prende e complacência do Código Penal, em alguns artigos, manda soltar.
Tribuna – O governo Bolsonaro representa algum risco à democracia?
Otto Alencar – Espero que não apresente nenhum risco à democracia. Eu vejo que as instituições estão muito sólidas: o Ministério Público e o Judiciário. Acho que não cabe mais ao Brasil um golpe militar, como teve em 1964. Na minha opinião, não existe clima para essa posição a não ser que haja uma ruptura completa de todo o processo do direito do cidadão. Aí seria um retrocesso muito grande. O estado de direito não pode ser rompido como já foi em outras oportunidades, embora o Brasil tenha tido, em vários momentos, essa natureza. É só observar. A revolução de 1930, o Estado Novo, depois em 1964, com golpe militar. Espero que não aconteça mais.
Tribuna – A eleição mostrou uma onda muito antipetista. Que rumo senhor acha que terá o PT?
Otto Alencar – Não posso responder pelo PT. É um partido importante. O candidato do Partido dos Trabalhadores teve uma votação expressiva. Tem grandes quadros dentro do PT. Como todo colegiado, teve componentes que aqui ou ali cometeram equívocos ou erros. Mas tem grandes quadros. Na Bahia, eu destaco o governador Rui Costa, que é um ótimo governador. Tem condições de fazer um segundo governo tão bom quanto o primeiro. O ex-governador Jaques Wagner e vários deputados estaduais, federais e prefeitos. Dentro de um colegiado muito grandes de políticos como o Partidos dos Trabalhadores, a sua grande maioria tem uma contribuição muito grande ao Brasil. Sempre um equívoco aqui e ali que pode comprometer a imagem do partido, mas é um partido que está vivo e que tem uma história também na política brasileira relevante.
Tribuna – Como o senhor viu a reeleição de Rui Costa?
Otto Alencar – A reeleição de Rui Costa foi esperada. Teve um arco de aliança que foi mantido com a presença de João Leão, do PSD, do PSB, do Podemos, do PDT. Todos compõem a aliança. Nós tínhamos absoluta certeza e confiança de que ele venceria no primeiro turno, respeitando, claro, a oposição. Mas nós tínhamos absoluta certeza da vitória e tivemos uma vitória expressiva. Não só do governador. O PSD conseguiu a vitória do deputado Angelo Coronel, que é senador eleito, de vários deputados estaduais e federais. Então, uma força política muito grande e unida. A unidade foi fundamental e temos absoluta certeza que venceríamos no primeiro turno. Mas, desde o início da campanha, respeitando os adversários.
Tribuna – O prefeito ACM Neto saiu fragilizado da disputa?
Otto Alencar – Ele não saiu fragilizado até porque ele não disputou as eleições. Talvez, tenha pensando em ser candidato, mas não foi. Eu não posso fazer avaliação do futuro, do que vai acontecer com o atual prefeito de Salvador. Eu creio que o partido Democratas não teve o desempenho que pudesse ser considerado um bom desempenho, como o PSDB também não teve. O PTB também não. Não estou falando de pessoas. Estou falando de desempenho da sigla partidária. Aliás, os partidos que compuseram a aliança que teve à frente o candidato José Ronaldo e outros componentes da majoritária não tiveram bom desempenho. Não gosto de me referir às pessoas. Eu quero me referir à aliança partidária que saiu muito fragilizada. Agora, quanto ao desempenho das pessoas, só o futuro vai dizer.
Tribuna – Como avaliou o resultado do PSD na Bahia?
Otto Alencar – Acredito que teve um bom desempenho. Nós tivemos um senador eleito. E agora teremos dois senadores compondo o nosso grupo. Fizemos quatro deputados federais e nove deputados estaduais. Não tivemos um crescimento, mas mantivemos o que tinha. Elegemos Coronel, que é uma força política considerável, com um desempenho excelente nas urnas.
Tribuna – O PSD já se movimenta para eleição de 2020?
Otto Alencar – Nós ainda não discutimos nomes, mas a nossa militância não para. Trabalha todos os dias para manter a relação de confiança com as bases. Nós estamos muito bem organizados. Em todo estado, temos, pelo menos, uma comissão provisória ou os diretórios formados. Vamos ampliar. Vamos com vontade e força para, pelo menos, manter a nossa estrutura de base.
Tribuna – Como o senhor tem acompanhado a disputa pela eleição na Assembleia Legislativa da Bahia?
Otto Alencar – Sobre a Assembleia, está a cargo do presidente Angelo Coronel, como deve ser, e do governador Rui Costa. O PSD tem um candidato consolidado que é o Adolfo Menezes. Os outros candidatos estão colocados. Cabe ao governador, com o presidente Angelo Coronel, buscar a unidade da base e fazer uma eleição que seja compatível com o Poder Legislativo. Acho que vai chegar à unidade. Espero que sim. Os partidos que apresentaram os nomes são capazes de presidir a Assembleia. São todos deputados experientes e capazes.
Tribuna – A oposição acusou o governador Rui Costa de estelionato eleitoral por apresentar, após a eleição, um pacote de austeridade. Como o senhor avalia este momento do governo?
Otto Alencar – Não considero que o governador cometeu nenhum ato desta natureza. A oposição sempre tem o direito de criticar, de falar, mas o governador, certamente, diante da crise que abateu diante dos estados, teve a responsabilidade de manter o ajuste fiscal. E vai buscar fazer para evitar o que está passando o Rio [de Janeiro] e outros estados por falta de controle das finanças. Quanto a essa colocação da oposição, claro que existe um exagero nessa colocação. Mas é o dever da oposição criticar e falar, mesmo exacerbando na crítica.
Tribuna – O senhor acredita que Bolsonaro vai dificultar a transferência de recursos para o estado?
Otto Alencar – Esse período do governo Temer, a Bahia foi o estado mais retaliado do Brasil. Ao ponto de até empréstimos termos que buscar com a decisão judicial. Nunca um governo foi tão perseguido na história da Bahia quanto foi perseguido o governo Rui Costa pelo atual presidente da República, Michel Temer, que deixará triste memória pela sua passagem na Presidência da República, sobretudo, no quesito moral. O próximo governo eu não posso avaliar. Tem que esperar os atos do governo. Não posso fazer previsão se o presidente da República, Jair Bolsonaro, vai cometer os mesmos atos de perseguição que cometeu o atual presidente.
Colaboraram: Rodrigo Daniel Silva e Guilherme Reis